segunda-feira, 14 de junho de 2010

O binarismo essencial em Amor & Sexo



Amor & Sexo é um programa de auditório da Rede Globo de Televisão, e tem forte preocupação com o entretenimento, apresentado pela modelo e atriz Fernanda Lima, que se propõe a debater, de maneira descontraída, temas relacionados ao sexo e amor.

Analisando Amor & Sexo segundo a perspectiva dos Estudos Culturais, corrente que pretende estudar a cultura contemporânea através de seus produtos, entende-se esse produto midiático como uma prática social significativa que constrói determinados discursos. O discurso, por sua vez, está inserido em uma formação discursiva composta pelo conjunto de significados hegemônicos de sua época.

A concepção do discurso como algo sempre construído na relação com um contexto desemboca na constatação de que os critérios para o julgamento da verdade também são contextuais. Logo, não existe verdade em absoluto ou, se existe, não está acessível aos humanos que estão invariavelmente perspectivados. Foucault afirma que existem formações discursivas que sustentam determinados regimes de verdade. Nesse sentido, os discursos constroem para si regimes de verdade – isto é, um ambiente em que se passam por naturais (não-históricos), “verdadeiros”. Muito embora, uma vez que a história é entendida como variável, não seja possível mais falar em verdade, e sim em coerência. Assim, antes de ser verdadeira ou falsa, uma proposição deve estar “dentro do verdadeiro”.

Para Foucault, portanto, o conhecimento é sempre uma forma de poder. O que pensamos que sabemos sobre determinado tema tem relação com o poder deste discurso de impor-se como “verdade”. Com isso, não se pode falar de uma verdade absoluta a priori de uma cultura, e sim, de uma formação discursiva que sustente um determinado regime de verdade.


No principal quadro do programa, a julgar pelo tamanho proporcional em relação aos outros quadros e pelas produções que giram em torno dele, o Strip Quiz, os convidados em par, formado por um homem e uma mulher, sempre com performance heterossexual, devem opinar sobre afirmações baseadas em generalizações acerca do seu respectivo sexo. Como exemplo, temos as seguintes perguntas feitas para a atriz Mariza Orth, na terceira edição do programa: “Toda mulher espera que o homem ligue no dia seguinte. Verdade ou mentira?”. Ou, ainda, a pergunta feita para a humorista Maria Paula, na quinta edição: “Não existe mulher difícil, existe mulher mal cantada. Verdade ou mentira?”.

Como fica evidenciada nas perguntas do Strip Quiz, a representação da sexualidade no programa é, predominantemente, marcada pelo binarismo essencial entre o macho e a fêmea. As diferenças entre eles são postas de maneira naturalizada, em última instância, de origem biológica. No jogo do binarismo, as mulheres são tratadas como naturalmente mais “complexas”, “emotivas”, “sentimentais”. Enquanto entende-s que os homens guiam sua prática sexual pelo instinto, tais como animais.

Há uma prescrição do que é ser homem e do que é ser mulher, como exemplifica a fala da apresentadora Fernanda Lima, na sexta edição do programa: “Homem não precisa tirar sobrancelha, não”. Ou, ainda, na segunda edição quando Fernanda Lima pergunta para a convidada Giovana Antonelli: “Dizem que a felicidade do homem está na cama e na mesa. E a felicidade da mulher?”. E Giovanna responde: “Acho que está no dia-a-dia, no compartilhar, no companheirismo, na troca, na gentileza. Acho que a mulher gosta de reunir mais quesitos e acho que o homem tem uma coisa mais prática. E eu acho que a mulher é um conjunto de coisas que vai fazer aquela relação, aquele homem ser incrível”.

O discurso predominante reforça a ideia de que todos os homens tem um modus operandi e todas as mulheres outro, de que as diferenças entre homens e mulheres estão baseadas em uma essência da origem, de que os homens vieram de Marte (são guerreiros) e as mulheres de Vênus (são para o amor).

Os dez episódios que foram ao ar estão disponíveis no site oficial do programa, e alguns podem ser encontrados no youtube.



Um comentário:

  1. Gostei do texto, mas acho que você poderia abordar mais sobre as consequências desse binarismo. Abraço!

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