sexta-feira, 20 de março de 2009

Antes de ler Sandra Harding...

Acho interessante ler este trecho do Dossiê Bioética e as Mulheres. Por uma bioética não sexista, anti-racista e libertária, da Rede Nacional Feminista de Saúde e Direitos Reprodutivos – RedeSaúde, produzido por Fátima Oliveira e Joaquim Mota.

Opiniões “científicas” sobre as mulheres.
As ciências biológicas, desde sempre, têm uma grande dívida com as mulheres. Herdeiras da tradição filosófica da antiga Grécia, as ciências biológicas incluíram em suas análises algumas “certezas”, como, por exemplo, a de Platão, ao afirmar que as mulheres eram reencarnação daqueles homens que, na primeira encarnação, se comportaram mal ou de forma covarde. Nascer mulher era, assim, uma punição dos deuses. Aristóteles, seguindo seu mestre Platão, conferiu valor científico a essa afirmativa, dizendo que as mulheres decerto não possuíam alma, condição para serem consideradas pessoas.
A partir de então, as ciências se desenvolveram e o fizeram baseadas na inferioridade das
carentes de alma e no único destino que poderiam ter, o “destino biológico” de procriar. Não é
à toa que a lenda bíblica conta que a mulher se originou de uma costela de Adão...
Na Idade Média, embora essas “verdades” permanecessem intocáveis, as mulheres
desenvolveram experiências e aprendizados e acumularam saberes, sobretudo na arte de curar e na obstetrícia. Desde a Antigüidade mais remota até o século XVII, a obstetrícia era uma
atividade desempenhada quase exclusivamente por mulheres, embora já no século XV os
cirurgiões começassem a se interessar pela arte de fazer parto.
Até o século XIV existem registros de mulheres médicas. A arte de curar era um misto de magia e conhecimento de ervas medicinais e conferia a quem a exercia – mulher ou homem – um grande poder e o status de sábio/a.
Gradativamente o saber masculino foi sendo oficializado. No século XV, teve início a
institucionalização da medicina, e freqüentar a Universidade – lugar proibido para as mulheres – passou a ser pré-requisito para seu exercício. O saber feminino é visto então como anticientífico,
uma vez que não foi aprendido nas escolas. Com a caça às bruxas, o exercício da arte de curar
pelas mulheres passa a ser considerado crime de feitiçaria. Algumas autoras feministas têm dito
que “a caça às bruxas foi um expediente de que se serviu a classe médica masculina para eliminar a concorrência das mulheres” (Lucia Tosi, química argentina radicada na França).
(Fonte: Tosi, 1987).
Com as grandes revoluções científicas, um mundo novo se delineia. A nova ciência biológica, em
parceria com o capitalismo, que também se apresentava como a redenção da humanidade,
pouco fez, no entanto, em relação às mulheres. Pensou-se, é certo, em uma nova natureza
feminina, só que partindo do reconhecimento das pseudoverdades da filosofia grega.
Embora o mito dos “poderes satânicos” das mulheres tenha caído por terra, perduraram as
idéias correntes dos poderes e fluidos maléficos dos ovários, das vaginas denteadas e vorazes,
do furor uterino e do fogo que se desprendia dos úteros das mulheres viúvas, das separadas e
das sexualmente insatisfeitas. A menstruação era um sêmen impuro, pelo qual as mulheres
perdiam enorme energia vital. O corpo feminino era governado pela “mãe do corpo” (o útero).
A frenologia afirmava que o cérebro feminino era menor que o masculino, sendo quase inútil. A
teoria dos instintos conferia às mulheres uma natureza animalesca.
Hoje, a endocrinologia afirma que as mulheres jamais fugirão da “prisão hormonal” e a
neurologia, às vezes, tenta fazer da diferença biológica uma “jaula para o instinto feminino”.
O dossiê completo está em:

http://www.redesaude.org.br/Homepage/Dossi%EAs/Dossi%EA%20Bio%E9tica%20e%20as%20Mulheres.pdf

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